2005 - Velejando o Brasil P4 - De Búzios até Vitória
Deixamos Búzios na popa às 6h30 numa manhã de céu limpo e mar levemente ondulado, na medida certa para empurrar o Andante rumo norte. Logo depois de içar a genoa, o vento leste firmou nos confortáveis 12 nós e, aos poucos, o casco deslizou pelos azuis do Atlântico com aquela cadência quase hipnótica que só a vela oferece.
A bordo, o piloto automático fazia sua parte enquanto a tripulação procurava o que fazer. Distribuímos as tarefas: um vigiava o rumo e os outros não faziam nada. Mas a pescaria inevitavelmente começou; a vara de pesca foi montada. Afinal, a ideia era aproveitar cada milha para tentar a sorte. Às 9h30, a linha esticou e, depois de uma curta disputa, trouxe-nos o primeiro dourado cintilante da jornada. Entre risadas e fotos, ajeitamos o peixe no freezer e a isca na água novamente. Aí veio a cavala, que foi consumida em Abrolhos.
O ritmo prazeroso da velejada fez as horas passarem num piscar de olhos; o sol já declinava e o espetáculo do entardecer no Cabo São Tomé tingia o horizonte de laranja, com o farol surgindo como sentinela solitária entre o mar e o continente. De vez em quando, a isca brilhante ainda arrancava lampejos prateados d’água, mas decidimos recolher a linha para evitar enroscos na escuridão.
À noite, os quartos de 4 horas com dois tripulantes e o vento mantinham o Andante a caminho do novo rumo depois do cabo, num céu sem nuvens, enquanto o “speed” registrava média de 6 nós. Mantivemos o rumo paralelo à costa, com vela mestra rizada e genoa cheia. No cockpit, aparecia às vezes uma alma gentil trazendo um café quente; era hora da troca de turno. Vinte e três horas depois da partida, já nos primeiros lampejos do amanhecer, estávamos no través de Guarapari.
Pelas 11h, entramos na Baía de Vitória e rumamos para o Iate Clube do Espírito Santo, ponto clássico dos pescadores de marlim-azul. Atracamos pouco antes do meio-dia. Ao pisar no cais, ainda com o sal ressecando a pele, fomos recebidos por um funcionário cordial que indicou o boxe e comentou, com orgulho, sobre as pesadas linhas de 130 lb que, semanalmente, partem dali em busca dos grandes marlins oceânicos.
No restaurante do clube, um ritmo desconhecido para nós preenchia o espaço: eram os tambores de um ensaio de congo capixaba, a música emblemática do estado, que ressoa como batida do coração local — perfeita trilha sonora para nossa travessia entre Búzios e Vitória.